Busca por exame preventivo de câncer ainda é baixa entre a população brasileira

Dados do Vigitel, disponíveis no Observatório da Saúde Pública — iniciativa da Umane — apontam uma queda na porcentagem de mulheres que já realizaram algum exame preventivo, entre 2019 e 2023, o que representa um sinal de alerta diante da alta incidência de câncer no país. Entre 2023 e 2025, o Brasil deve registrar, a cada ano, cerca de 73,6 mil novos casos de câncer de mama e 17 mil de câncer do colo do útero, segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca).

Os exames preventivos são fundamentais para a detecção precoce do câncer, que aumenta as chances de cura e permite tratamentos menos invasivos. 

Mesmo com o alto número de novos casos, procedimentos essenciais como a mamografia e o Papanicolau seguem com cobertura abaixo dos níveis pré-pandemia, de acordo com os dados mais recentes do Observatório da Saúde Pública. Entenda melhor abaixo.

Exame preventivo: quais são os principais?

As doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como câncer, doenças cardiovasculares, hipertensão e diabetes, estão entre as principais causas de morte no Brasil e no mundo. 

Essas condições evoluem de forma lenta e silenciosa; por isso, o exame preventivo tem papel central na redução da mortalidade precoce.

Abaixo, os principais exames preventivos utilizados no rastreamento de câncer, de acordo com o Ministério da Saúde:

  • Papanicolau: detecta alterações no colo do útero e recomenda-se para mulheres entre 25 a 59 anos (Biblioteca Virtual em Saúde/Ministério da Saúde). As mulheres devem realizar o exame anualmente, no início. Depois de dois exames seguidos, com intervalo de um ano e resultado normal, elas podem passar a realizar o preventivo a cada três anos;
  • Mamografia: identifica sinais precoces de câncer de mama e é indicado a cada dois anos para mulheres entre 50 e 69 anos (Instituto Nacional de Câncer – INCA/Ministério da Saúde), sem sinais e sintomas da doença;
  • Colonoscopia: rastreia câncer colorretal; pessoas com sinais e sintomas sugestivos de câncer ou por pertencentes ao grupo de médio risco (50 anos ou mais) ou alto risco (indivíduos com histórico familiar ou com doenças inflamatórias do intestino ou síndromes genéticas), devem realizar o exame;
  • Toque retal e PSA: usados para rastrear câncer de próstata; porém, o Ministério da Saúde não recomenda o rastreamento em homens sem sinais ou sintomas.

Busca por colonoscopia apresentou crescimento

Entre os exames de colonoscopia, mamografia e Papanicolau, apenas a colonoscopia apresentou crescimento no número de procedimentos realizados desde a pandemia. 

Segundo dados do DATASUS – SIA, disponíveis no Observatório da Saúde Pública, o número de colonoscopias realizadas pelo SUS subiu 65,5% entre 2019 e 2024, passando de 347,1 mil para 574,6 mil por ano, entre homens e mulheres.

Entretanto, os exames de mamografia e Papanicolau, segundo os dados da Vigitel, seguem em queda entre as mulheres das capitais brasileiras. Entre 2019 e 2023:

Mamografia: o número de mulheres com 18 ou mais anos de idade que já realizaram mamografia, ao menos uma vez, caiu de 64,9% para 59,8%.

Papanicolau: o número de mulheres com 18 ou mais anos de idade que já realizaram papanicolau, ao menos uma vez, caiu de 83,1% para 78,9%.

Exame preventivo - Evolução de mulheres que fizeram mamografia
Exame preventivo - Evolução de mulheres que fizeram Papanicolau

O que explica as quedas sobre exame preventivo?

Cinco anos após o início da pandemia, a realização de exame preventivo no Brasil ainda não voltou ao patamar anterior à crise sanitária. Um estudo publicado na revista Ciência & Saúde Coletiva mostra que a pandemia interrompeu um ciclo de avanços observados desde os anos 2000.

Segundo o estudo, por exemplo, houve piora nos hábitos de vida da população, aumento do sedentarismo, obesidade, hipertensão e diabetes, além da redução na realização de exames preventivos. Esses são alguns fatores que intensificaram esse impacto:

  • Interrupção de consultas e procedimentos eletivos;
  • Realocação de profissionais de saúde para atendimento à covid-19;
  • Medo da população em procurar unidades de saúde.

Mas os entraves não se limitaram ao período da pandemia. O cenário brasileiro já apresentava desafios anteriores relacionados à falta de campanhas permanentes de conscientização, desinformação sobre quando e como realizar os exames e barreiras logísticas — como a distância dos serviços de saúde, a dificuldade de transporte e a incompatibilidade com a rotina de trabalho. Além disso, o acesso à saúde é desigual entre as regiões do país. Dessa forma, segundo dados do Observatório da Saúde Pública, as dez capitais com pior cobertura de mamografia estão localizadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Diagnóstico tardio: mais caro para o sistema e para o paciente

O diagnóstico tardio de câncer impacta não apenas a vida do paciente, mas também o orçamento do sistema público de saúde. Dessa forma, quanto mais avançado o estágio da doença no momento do diagnóstico, mais complexos e caros tendem a ser os tratamentos, com menores chances de sucesso.

Um estudo divulgado pela Fiocruz mostrou que, em 2022, os gastos federais com o tratamento oncológico no SUS chegaram a quase R$ 4 bilhões

Segundo o estudo “Quanto custa tratar um paciente com câncer no SUS?”, foram destinados R$ 62 bilhões do total de R$ 136 bilhões investidos em saúde no ano, para a assistência hospitalar e ambulatorial, bem como quase R$ 4 bilhões exclusivamente para tratamento de câncer, sendo:

  • 77% para procedimentos ambulatoriais (como quimioterapia e radioterapia);
  • 13% para cirurgias;
  • 10% para internações.

Entre 2018 e 2022, o custo médio dos procedimentos oncológicos aumentou em 402%, passando de R$ 151,33 para R$ 758,93. Cirurgias passaram a custar, em média, R$ 3.406,07; e internações, R$ 1.082,22 por paciente.

Além disso, parte desse crescimento se explica pela baixa estruturação de políticas públicas voltadas ao diagnóstico precoce. 

O sistema de saúde ainda concentra a maior parte dos investimentos em tratamentos de alta complexidade, enquanto ações de rastreamento e prevenção seguem com financiamento limitado.

Exame preventivo no centro do cuidado

A retomada dos exames de prevenção precisa ser parte central das estratégias de fortalecimento da atenção primária à saúde no Brasil. 

Além de ampliarem as chances de cura e possibilitarem tratamentos menos agressivos, exames para a prevenção do câncer e de outras doenças crônicas não transmissíveis ajudam a reduzir a sobrecarga no sistema e a tornar os cuidados mais eficientes e sustentáveis.

A solução deve englobar os seguintes passos: fortalecimento das práticas de rastreamento; redução das desigualdades de acesso e maior esforço de conscientização da população. 

Assim, poderemos garantir que sejam feitos mais diagnósticos no momento certo, com mais chances de sucesso para o paciente e menos custos para o sistema.

Acesse o Observatório de Saúde Pública.